terça-feira, 22 de março de 2011

Cabaré


Podia bem ser o final do mundo. Ou antes, o que vinha depois. Depois do deserto, dos buracos, da poeira e dos oásis – a pequena casa; discreta, a não ser pela solidão com que se erguia da terra.

Uns carros em volta. Os homens na porta.

História de uma mulher.

O percurso, a casa e todos ali.

Embora não fosse ela que a tudo sustentasse no lugar.

Enquanto se esperava, o sol queimava no mesmo silêncio; podia muito bem nada existir.

Então os homens entravam um punhado por vez. Todas as cadeiras voltadas para a cortina.

A mulher em algum lugar.

De repente, a mão se deixava ver. Delicada e ardente. Surgia dum canto e ali mesmo sumia.

Num outro canto, o pé, e os dedinhos, e as unhas pálidas.

Então uma perna (as luzes apagadas, o holofote no palco), toda uma coxa irrompia, provocando a castidade da cortina. Pra fugir depois dos olhos.

Tudo durava poucos minutos. Quando acabava, acendiam-se as luzes.

Nada era cobrado. Nada era servido.

Os homens se erguiam, e davam lugar aos outros, a sentarem como os primeiros, a espera do escândalo.


(Arte: Luiz Cadaval)

Um comentário:

  1. Gostei de tudo, das escrituras verbais, das escrituras não-verbais, do título do blogue...

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